quinta-feira, 6 de março de 2008

Emagrecendo com o BOLINHA

Nasci gordo, fui uma criança gorda, um adolescente com diversas variações entre gordinho e obeso, e agora sou um adulto obeso, nunca olhei para o meu pênis sem que tenha uma protuberância entre ele e meus olhos. Isso nunca foi um grande incômodo, exceto quando eu era uma criança e precisava usar trajes de banho na escola ou em qualquer outro lugar perto de outras crianças. Ainda me lembro de quando fazia primeira série no colégio Objetivo, no primeiro dia de aula de natação, eu entrei dentro do banheiro e fiquei escondido no reservadinho só pra não ter que ficar de sunga perto dos meus colegas. A professora me dedou, obviamente, e tomei esporro da minha mãe. Aliás, daquela época e daquela escola, não tenho absolutamente nenhuma boa lembrança.

Engraçado é que na família, uma criança gordinha é "coisinha linda da mamãe", "trenzinho lindo da titia", "amor da vovó"... Aquela tia que te vê uma vez por ano sempre diz "Nossa, mas você é lindo demais! Que pele linda!". Que beleza! Se eu fosse um geriatra faria um sucesso inigualável, sou admirado pela terceira idade em peso. Agora, aquela garota linda da escola simplesmente não me olhava, é como se eu fosse uma lata de lixo no pátio da escola, nem papel de balinha me jogavam. Mas tudo bem, o ser humano é altamente adaptável, se as lindas não me olhavam, eu fazia amizade com as feias e hora ou outra ganhava uma sobra.

Tá certo que as chances de um gordinho com a garota mais bonita da festa é de 1% ou menos, mas garotas bonitas são igual a biloquê de madeira, se você não desiste, uma hora acerta o pino. E pra azar das bonitas, as vezes eu tinha meus minutos de sorte e conseguia-lhes um beijo.

Bom, na adolescência, a obesidade é guerra, mas quando adulto isso não tem assim tanta importância. O negócio é fazer um bom trabalho de labiação e rááá: capturar a presa. Parece que nesta fase da vida, garotas e garotos procuram boa companhia, estabilidade (leia-se $grana$ suficiente p/ levar uma vida minimamente social) e aparência vem em terceiro plano.

Outro dia estava navegando pelo orkut quando encontrei o perfil de um antigo colega, no álbum de fotografias vi várias fotos do sujeito de corpo bem feito, sempre cercado de vários rapazes e garotas lindas, só existiam belas pessoas naquele álbum, de repente comecei a me sentir deprimido, fiquei me imaginando no meio daquela foto com uma barriga branca e enorme se destacando pela bizarrice. Decidi tomar uma atitude: vou emagrecer!

Primeiro dia após minha decisão, uma fatia de mamão no café da manhã e sigo p/ o trabalho. Na volta para o almoço venho mentalizando "comerei só verduras", quando sento na mesa começa a luta: 1 porção de salada, outra porção de salada que é pra tentar inibir o desejo desesperado de matar o bifão que está ali, a poucos centímetros dos meus talheres, mais um pouco de salda pra ver se entope esse buraco sem fundo chamado de estômago. Acaba a salada e começo a tremer, são sinais claros da abstinência por bifes e frituras e num ato quase de chilique, pego um bife e devoro-o sem nem mesmo mastigar direito, nesse ritmo continuo com os próximos 3 bifes. Depois do almoço, sento diante a televisão e começo a refletir sobre meu selvagem descontrole diante de um mero bife e me sinto envergonhado.

Mais tarde, voltando do trabalho mentalizo novamente "não jantarei, comerei apenas uma fruta". Chego em casa e começa a luta, em cima da mesa há quibe, torta de tomate, salada de bacalhau no azeite, torradas e uma garrafa de coca bem gelada, mas estou decidido: comerei apenas frutas! Como 1 laranja, 2, 3, 4, enjoei de laranjas. Olho de rabo de olho para o quibe enquanto escuto o "tsiii" da minha mãe abrindo a garrafa de coca cola, num movimento carregado de ódio pego um melão e como praticamente a metade. O excesso de melão em meu organismo parece exaltar o cheiro da torta de tomate, meu desejo por ela chega a doer no coração e então resolvo comer só um pedacinho e aí a gente já sabe, um gordo NUNCA come só um pedacinho daquilo que gosta, é como se dissesse que um viciado em cocaína fosse cheirar só uma colherinha de chá. Uma hora depois, com a barriga lotada de salada de bacalhau, torta de tomate e quibe, arremato a última gota da garrafa de coca-cola.

Sento em minha cama, a cabeça pesa mais que a barriga, acabo de fazer algo do qual sinto vergonha. Me orgulho do meu auto-controle, nunca peguei 1 real de ninguém mesmo sabendo que ninguém saberia disso, nunca me envolvi numa briga ou discussão mesmo sendo humilhado, nunca traí uma namorada, nunca fui embora no meio de uma aula insuportável, nunca pedi um cobertor na casa dos outros mesmo morrendo de frio, nunca me abri com alguém mesmos nos extremos momentos de angústia... Entretanto, sou derrotado por uma simples lasca de parmesão.

100% dos nutricionistas dizem "Você precisa aprender a comer. Coma de tudo, mas coma pouco." Um gordo não come pouco, essa é a questão. Ou ele não come nada, ou come o que tem até acabar. Sabendo disso resolvi radicalizar. Tentei ser sutil com meu corpo, cortando o alimento aos poucos, mas como ele não aceitou, vou eliminar a comida da minha vida. Isso mesmo, a partir de agora minha boca só servirá pra falar e beijar, nada mais.

Logo cedo começo a estratégia, acordo o mais cedo que posso antes que alguém coma algo na minha frente, corro para o carro e vou trabalhar sem comer nada no café da manhã, não volto para o almoço, melhor ficar no trabalho, rende mais e de tabela acabo emagrecendo. A noite, quando chego em casa passo correndo pela cozinha para que meus olhos não enxerguem nenhum tipo de comida, sento na frente do computador e dali só saio a meia noite pra ir dormir.

No segundo dia eu me sinto bem, apenas com a boca amarga, vou para o trabalho e as paredes do meu estômago ficam se atritando. As quatro horas da tarde minha visão está estranha, as vezes tenho súbitas vontades de vomitar. A noite é bom, barriga vazia é aliada do bom sono, dormi como um príncipe! Terceiro dia, acordo cedo e percebo que minha pressão está baixa, faço uma consulta c/ o Dr. Google e descubro que falta de vitamina A causa cegueira e esse deve ser o motivo da minha visão estranha.

Alguém me liga pedindo pra doar sangue pra não sei quem que está internado não sei aonde. Pensei: ótimo! Meu sangue está limpo! Posso doar até p/ a última virgem do paraíso. Cheguei no banco de sangue a logo na triagem a moça me dá um esporro, disse q não tenho plaquetas e preciso comer urgente. Essa vadia tem inveja do corpinho que terei, por isso quer atrapalhar minha dieta! Tive que marcar a doação p/ outro dia, o enfermo desconhecido que espere!

À noite combinei de sair c/ amigos, o local em questão é uma pizzaria que, por pura sacanagem do destino, é uma fábrica de um dos meus alimentos favoritos. Chego mais cedo, sento na mesa e já imagino o quão difícil será dar seqüência a minha dieta naquele ambiente hostil às anoréxicas. Peço um chope e prometo pra mim mesmo que esta será a refeição da noite. Tomo uma tulipa e aquilo faz meu organismo regorjear de alegria, em poucos minutos me sinto deliciosamente bem, meu organismo sugou aquela pequena quantidade de álcool como uma criança somaliana sugaria um milk-shake do Bob's.

Como bom gordo que sou, tomo meu quinto chope em menos de 30 miutos, meu estômago faz tantos barulhos que me sinto, deveras, preocupado. Minhas vistas estão longe e agora, meu organismo me pede alimento de uma maneira mais direta.

Bom, acho que um Gourjon de Peixe com molho tártaro, neste momento, seria, inclusive, necessário. Penso um pouco e vejo que uma fritura não seria bom, um anoréxico jamais faria um pedido desses, melhor pedir um assado ou grelhado. Chamo o garçom: "Rocha, por favor, traga-me um surubim na chapa."

Minutos depois lá vem meu surubim fumegante, numa quantia humilde, ele, o surubim, parecia sorrir pra mim em meio a tantos pimentões, cebolas e mandiocas que tentavam justificar o preço do meu prato. É como se o Rocha fosse um súdito levando o alimento a seu deus. Devorei aquele magnífico surubim com molho tártaro, foi como um orgasmo prolongado.

Meus amigos chegaram quando eu comia a última cebolinha da chapa de surubim, dali pra frente foi uma noite de excessos e meu paladar pode matar a saudade de tantos sabores: calabresa, rúcula, aliche, bolognesa, presunto parma...

No outro dia, quando passava por uma farmácia, resolvi verificar o saldo parcial da minha dieta. Subi na balança e fiquei puto! Três dias passando FOME e perdi apenas 500 gramas! Provavelmente era o xixi que havia feito minutos antes. Puta que pariu, dieta não é nada gratificante. Vou dar uma bica nessa merda e fazer as pazes com o bom e velho salaminho italiano, o parmesão amigo de todas as horas e o miojo são expedito matador das fomes urgentes.

O gordo é engraçado. Ele nunca é gordo por acaso, mas ele sempre tem algo pra culpar seu excesso de peso. É a genética, predisposição, ansiedade, falta de tempo pra alimentar bem, preço das verduras, biotipo, medicamentos... Nunca o pastel, a coxinha, os pacotes de Ruffles de frente a tv, o tubo de açúcar, vulgarmente conhecido como refrigerante... Note uma coisa: quando você estiver andando pelo centro ou shoppings, note que, dificilmente verá um gordo que não esteja mastigando algo, seja pastel, sorvete, chiclete, pipoca... o gordo é uma máquina de processar alimentos.

Quando eu tinha 23 anos pesava 72kg, hoje, com 28 anos peso 92kg, ou seja, levei 5 anos para engordar 20kg e fico puto por não ter emagrecido em 3 dias.

Enfim, se você é gordo e quer emagrecer, pule numa cisterna abandonada, lá é o único lugar aonde você não vai comer e depois de uns 8 dias quando derem falta de você, te encontrarão lá dentro e já terá perdido bem uns 8kg, nem que seja pela desidratação.

2 comentários:

Unknown disse...

Bolota...
Excelente texto... mijei de rir!!! :)

Abraços,
Pepeu

Gente Fina disse...

Hahaha mto bom!

Agora no armário eu desmontaria e passaria cola nas gavetas... uma hora vai fazer falta!