terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Mens puter in corpore sano.

Lá na infância, lá atrás, num tempo de muita fantasia, pouca vivência e numa fome louca de diversão, imaginei muito sobre o futuro. Era incrível! Nos famosos cadernos de perguntas e respostas, a meninada fazia altas previsões para o futuro. Ainda carentes de criatividade, era fácil deixar-se levar pelas respostas das outras crianças:
Como será sua vida aos 21 anos de idade?
“Casado, com um casal de filhos, comerciante…”
“Casado, com um filho, professor…”
“Médico que faz caridades…”
“Casado, 3 filhos, bombeiro...”

Nas primeiras manhãs de dezembro, quando trazia meu boletim pra casa, o tempo passava devagar, muito devagar! Aquela angústia por ter em mãos o peso de péssimas notas. Enquanto caminhava de volta pra casa, me perguntava por quê não dedicara mais durante o ano? Por que me entreguei tão facilmente à preguiça.

Fora os momentos de tensão da vida pré-adolescente, o tempo passou voando! De repente lá estava eu: 21 anos, carteira de motorista e cursando faculdade. Nada de filhos, nada de casamento… de tão próximo à infância, com 21 anos, me sentia mais um adolescente com regalias do que um adulto.  

Um tempo interessante, sem muita pressão, pouco dinheiro e bastante convívio social. A vida era um evento que acontecia diariamente. Uma das maiores aflições era gerenciar ataques e esquivas na vida amorosa (no meu caso, mais ataques do que esquiva, vai).

Das minhas pressuposições feitas na infância, na adolescência ou até o início da vida adulta, nada é parecido com o que vivo hoje. Numa orientação muito errada, ao logo do tempo fui abandonando a diversão e abraçando indiscriminadamente os compromissos. E é estranho porque a sociedade acaba por me tecer elogios diante desta inversão da vida. Numa arcaica visão social, carregar uma vida com aflituosos compromissos é sinal de responsabilidade.

E aqui estou eu, um adulto responsável, que aprendeu a ser adulto no modo mais sisudo possível e enterrou em profundidade pré-salinas a alegria adolescente suave de outrora.

Tão desbastado de felicidade quanto Harry Potter numa convenção de Dementadores, acordo me perguntando qual a lógica em sair da cama. Por que me dou o trabalho de levantar?  Qual é a parte positiva desse modelo de vida fracassado que construí?

Às vezes, em ocasiões de salubridade psíquica, a posição de fundo de poço na qual me encontro, parece reversível. Somos partícula de poeira diante das formações galácticas assombrosamente gigantescas. Meu problemas são meras insignificâncias.

Mas na laboriosidade do dia a dia, minha pequenez se faz grande, aflorando uma dolorosa afecção mental que me faz sentir morrer lentamente. Completamente sem esperança, mesmo uma tarefa simples como levar o lixo pra fora, parece um esforço em vão.